Embora a nona professora emérita da UFPA, Maria de Nazaré dos Santos Sarges, se orgulhe, antes de tudo, de ser professora, razão maior de sua atuação na Instituição, seu nome estará, indelevelmente, inscrito na pesquisa científica e na produção historiográfica como autora de dois livros que se tornaram referências nos estudos sobre a Belle-Époque na Amazônia. Belém – Riquezas produzindo a Belle-Époque (1970-1912) e Memórias do Velho Intendente determinaram uma nova guinada nos estudos daquele período de grandes transformações na capital paraense, sob a economia da borracha. Naná, como é carinhosamente chamada por seus pares da academia, é de tal forma apaixonada pela docência que, mesmo aposentada, continua em sala de aula como professora voluntária da UFPA.
Graduada em História pela UFPA (1968), Nazaré Sarges fez o mestrado em História na Universidade Federal de Pernambuco (1990), o doutorado na Universidade Estadual de Campinas (1998) e o pós-doutorado na Universitat de Barcelona/ES (2011). Foi professora titular da Faculdade de História e do Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia (PPHIST), do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFPA, e coordenadora da Cátedra João Lúcio de Azevedo, vinculada ao Instituto Camões – PT (2018-2024). Atua no ensino de História, com ênfase nas disciplinas História do Brasil Império e História Antiga e Medieval. No PPHIST, pertence à linha de pesquisa Cidade, floresta e sertão: cultura, trabalho e poder. Maria de Nazaré Sarges é sócia do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, titular da cadeira nº 65, cujo patrono é sua ex-professora Maria Annunciada Ramos Chaves.
Na administração acadêmica, Nazaré Sarges foi vice-coordenadora e, posteriormente, coordenadora do curso de História, chefe de Departamento e, por oito anos, diretora do atual Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFPA. Ela também integrou o grupo pioneiro de professores que desenvolveu o Programa de Interiorização da UFPA, implementado na década de 1980, responsável pela expansão do ensino superior no estado, pela formação de milhares de professores e por possibilitar a criação da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) e da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa).

Paraense, natural de Belém, Nazaré Sarges nasceu numa família de seis irmãos. “Meu pai era marítimo e minha mãe dona de casa, mas ambos davam muita importância à educação dos filhos. Eles diziam que só poderíamos ser alguém se estudássemos. Todos os filhos fizeram faculdade. A educação era uma prioridade para nossos pais, assim como prioridade era também a mesa farta todos os dias, mesmo que fôssemos pobres”, conta.
Na infância e adolescência, ela estudou no Grupo Escolar Rui Barbosa, no Colégio Gentil Bittencourt e no Colégio Estadual Paes de Carvalho, no qual foi aluna dos “melhores professores, como Acyr Barros Pereira, de Português; Wilton Moreira, de História; professor Skeet, de Inglês; uma nata que fazia do Paes de Carvalho um colégio público referência no ensino”, define. Enquanto cursava o clássico no Paes de Carvalho, Naná também estudou o magistério na Escola Normal, porque sua mãe queria que ela se tornasse professora, mas um problema de saúde a fez abandonar o curso clássico. Sua mãe a fez prometer nunca abandonar o magistério.
Em 1965, ela começou, efetivamente, a cumprir a promessa à mãe ao ingressar no curso de História, então pertencente à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UFPA, cujo prédio ficava na avenida Generalíssimo Deodoro. Tinha, então, 17 anos. Na Universidade, foi aluna de Annunciada Chaves, Paula Chaves, Nilza Fialho, Benedito Nunes, Braga Elói e Otávio Mendonça, que era professor de Filosofia e substituía, eventualmente, Benedito Nunes.
“A faculdade parecia um Olimpo, os professores, verdadeiros deuses, e nós, alunos, pobres mortais tentando entender as aulas. Tive uma plêiade de professores da melhor qualidade, recorda Sarges. Naquela época, o ensino de História era ministrado como uma narrativa; a História não era estudada como um processo, como nos dias de hoje. Era um ensino muito focado em datas e nos personagens, não tínhamos espaço para indagar os professores. Mas, de alguma forma, nos levava a pensar, a raciocinar”, explica.
Ela conta que os professores de então se apoiavam em autores clássicos da História, como Capistrano de Abreu, Pedro Calmon, Antonio Mattoso, entre outros. Mas não havia indicação bibliográfica para apoiar a aprendizagem dos alunos. “Aqueles autores clássicos eram apenas citados nas aulas. Não líamos seus textos. As aulas eram sempre uma espécie de conferência do professor”. A mudança na metodologia do ensino de História ocorreria alguns anos depois, quando uma nova geração de professores voltou da pós-graduação com um aporte teórico renovado, com base em pressupostos historiográficos atualizados, com destaque à Escola dos Annales, à concepção marxista de E.P. Thompson e à história social da Arte. Entre os professores que efetivamente contribuíram com a mudança de patamar no ensino de História, da UFPA, está o nome de Maria de Nazaré dos Santos Sarges e de colegas como Edilza Joana Fontes, Ruth Burlamaqui de Moraes, Aldrin Figueiredo, Geraldo Mártires Coelho, Magda Ricci e outros.

Após a conclusão da graduação em 1968, ela foi aprovada em concurso público para docente da Faculdade de História da UFPA, em 1973. Grávida da primeira filha, ela só foi chamada para assinar o contrato com a Universidade no ano seguinte. Não seria aquela, porém, a primeira experiência no exercício do magistério. Ainda no primeiro ano da faculdade, a jovem universitária ministrou aulas para 5ª série primária na Escola Estadual Augusto Olympio, depois no Colégio Pará-Amazonas e, em seguida, no Colégio Abraham Levy. Já com o diploma do curso superior, Nazaré Sarges voltou para o Paes de Carvalho, agora na condição de professora. Também foi professora no Colégio Nossa Senhora do Carmo e no Colégio Nazaré, tradicionais colégios de confissão católica de Belém. Essas experiências serviram para pavimentar a trajetória da professora que, há mais de cinco décadas, se dedica ao ensino na UFPA.
O título de Professora Emérita à Maria de Nazaré Sarges foi proposto ao Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe) pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, e aprovado em 2023, como um justo reconhecimento da Instituição e de seus pares à trajetória desta docente que se destacou na pesquisa e na administração acadêmica e, acima de tudo, no ensino, conforme destaca o parecer da outorga do título: “Não resta dúvida que a professora Sarges compôs o núcleo embrionário da pesquisa na área, e, atualmente, muito do que foi iniciado por ela destaca a UFPA na área de História. Entretanto, por mais que não tivesse descuidado da necessidade da pesquisa para consolidação da área, o ensino sempre foi seu foco maior”.
Meninas e Mulheres na Ciência – Esta é a penúltima matéria da série “Meninas e Mulheres na Ciência 2025”, iniciada no dia 11 de fevereiro, que tem o objetivo de homenagear as professoras eméritas da UFPA. O Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência foi criado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e pela Organização das Nações Unidas (ONU) como forma de reconhecer o papel fundamental exercido pelas mulheres e pelas meninas para o desenvolvimento da ciência no mundo.
A data se configura como um marco para a promoção do acesso à ciência de maneira igualitária, buscando, dessa forma, incentivar que mais mulheres e meninas avancem em suas carreiras científicas contrariando qualquer estereótipo de gênero. Além de ser uma prioridade global da agenda da Unesco, essa ampliação da participação das mulheres na ciência é também um fator imprescindível para que novas perspectivas sejam analisadas e a criatividade se desenvolva ainda mais nas diferentes áreas de estudo.