Com o objetivo de analisar de que maneira os conflitos socioambientais entre comunidades tradicionais e áreas protegidas vêm sendo abordadas pela produção científica ao longo do tempo e compreender de que maneira a ciência tem discutido esses conflitos, um grupo de pesquisadores desenvolveu o estudo Socio-Environmental conflicts and traditional communities in protected areas: a scientometric analysis, publicado na revista Journal for Nature Conservation. O artigo analisou mais de 250 artigos científicos publicados em duas bases de dados, entre os anos de 1990 e agosto de 2024.
Além de contribuir com recomendações para políticas mais inclusivas e eficazes de conservação, a pesquisa faz parte da tese de doutorado do residente de Pós-Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Pará (Ppgeco-UFPA), originário da comunidade ribeirinha de São Benedito do Ituqui, no município de Santarém, Everton Silva. Com a orientação do professor José Max Barbosa e coorientação do professor Fernando Geraldo de Carvalho, o estudo traz uma abordagem cienciométrica focada na análise das tendências, lacunas e principais categorias de conflitos relatadas em estudos acadêmicos.
Para tanto, a equipe de pesquisadores analisou 263 artigos científicos, disponibilizados nas bases Scopus e Web of Science, nas quais foram publicados artigos relacionados ao tema de conflitos socioambientais envolvendo comunidades tradicionais. A análise pôde detectar os padrões e responder às perguntas estabelecidas no estudo, possibilitando identificar os padrões de publicação, os temas mais discutidos, os grupos populacionais mais estudados, os tipos de áreas protegidas envolvidas nos conflitos e as principais categorias de tensões socioambientais.
De acordo com Everton Silva, a investigação é importante por oferecer uma base empírica sólida para repensar políticas de conservação e promover a inclusão de comunidades tradicionais como protagonistas na gestão das áreas protegidas. “Ela contribui para o fortalecimento da justiça socioambiental, revela lacunas importantes na produção científica e propõe caminhos para estratégias mais equitativas e eficazes. Além disso, valoriza a ciência amazônica e reafirma a necessidade de integrar os saberes tradicionais aos processos de conservação da biodiversidade”, explica.
Como resultado, o estudo apontou um crescimento expressivo nas publicações sobre o tema, principalmente depois do ano de 2017. Grande parte dos estudos aborda conflitos relacionados ao acesso a recursos de subsistência, à gestão das áreas protegidas e às interações com a fauna silvestre. Foi identificado também uma sub-representação de estudos com povos indígenas e uma predominância de artigos sobre reservas e parques nacionais. Além disso, observou-se um desequilíbrio na autoria dos estudos, com maior produção por instituições do Norte Global, mesmo com o foco sendo nas regiões do Sul Global, como Brasil e Índia.
“Embora os dados reflitam contextos específicos de diferentes países e tipos de áreas protegidas, os padrões identificados, como a exclusão de comunidades tradicionais e os impactos sociais das políticas de conservação, são recorrentes em diversas regiões. Por isso os resultados podem subsidiar estratégias de gestão em outras áreas tropicais com características e desafios semelhantes”, complementa o pesquisador.
A pesquisa teve financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), e está vinculada aos Projetos de pesquisa Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Sínteses da Biodiversidade Amazônica (INCT-SynBiAm) e Programa de Pesquisa em Biodiversidade da Amazônia Oriental (PPBio-AmOr).