Racismo ambiental é pauta importante na COP 30

Um tema relativamente novo nas Ciências Socioambientais, o racismo ambiental, foi um dos destaques da COP 30 nesta sexta-feira, 14. O conceito surgiu durante a luta por direitos civis dos negros americanos por volta da década de 1970,  tendo sido  usado, pela primeira vez, por Benjamim Chavis, em 1982. No Brasil, o conceito de racismo ambiental começou a ser usado nos anos      2000, referindo-se a casos de injustiças ambientais sofridas por populações vulneráveis.

Na UFPA,um dos grupos que se voltam ao estudo do tema é o Grupo de Pesquisa Grandes Projetos na Amazônia (GPA), do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia (PPGEDAM), do Núcleo de Meio Ambiente (Numa), liderado pelo sociólogo André Luis Assunção de Farias, doutor em desenvolvimento socioambiental, que participou de painel na Zona Azul, com Christian Nunes, geógrafo e diretor do Numa.

Recentemente, o GPA publicou o artigo “Racismo ambiental e grandes projetos na Amazônia urbana: a distribuição desigual de danos e riscos sobre grupos racializados, na Região Metropolitana de Belém (RMB)”, no qual se define racismo ambiental como expressão da desigualdade ambiental em que as comunidades negras, pardas ou étnicas são atingidas  de forma desproporcional, ameaçando seus modos de vida. Assim, as noções de raça, gênero e classe, num processo de cruzamento e interação, ajudam a compreender as formas de  racismo ambiental produzidas por grandes projetos sobre as comunidades nas cidades, como destaca Natália Ferreira, em artigo publicado em “Fronteiras: Revista Catarinense de História”.

Citando Ramón Grosfoguel, André Farias observa que, no Brasil, o  racismo ambiental amplia a desumanização ao romper os laços entre ser humano e natureza. “Existe uma infinidade de casos de racismo ambiental no Brasil, que vão de populações negras atingidas por desastres ambientais, como no caso de Mariana e Brumadinho, até as recentes enchentes no Rio Grande do Sul ou as chacinas policiais no Rio de Janeiro, pois o racismo ambiental tem uma dimensão de violência considerável”, explica.

Segundo ele, há esforços no Brasil de mensurar os casos de racismo ambiental, mas o Estado ainda não tem mecanismos para identificar, descrever e prevenir tais casos. Destaca-se o trabalho do Ministério de Igualdade Racial como um esforço louvável e o último censo do IBGE, que deu visibilidade a comunidades quilombolas, mas ainda é insuficiente. Seria necessário uma ação transversal, interministerial e compartilhada entre níveis de governo para avançar. Além da ampliação de políticas públicas construídas com a participação desses grupos sociais.

Em âmbito regional, o sociólogo do Numa afirma que, na Amazônia, há uma dívida histórica com os grupos étnicos, negros, pardos e indígenas, que carecem mais do que nas demais regiões do país de políticas e ações públicas. “Um pequeno avanço foi a criação da Secretaria Estadual de Direitos Humanos, em 2007, e agora da Secretaria Estadual de Povos Indígenas, mas ainda com atuação marginal no campo das políticas públicas”, avalia. No entanto diz que “ainda encontramos agressões e degradação ambiental, que também se configuram em racismo ambiental sobre os territórios indígenas dos Xicrins, Tembés e Mundurucus, só para citar alguns casos”.

Em relação a Belém e à Região Metropolitana, André Farias afirma que, “nos tempos atuais, só podem entrar como maus exemplos de respeito aos direitos dos povos negros e etnias”. Ele cita os casos de racismo ambiental contra os moradores negros e pardos da Vila da Barca, em Belém, ocasionado pelo grande Projeto urbano Nova Doca, contra os quilombolas e os ribeirinhos de Barcarena, afetados pelo polo industrial e pelas empresas multinacionais, e os casos de contaminação e poluição que sofrem os quilombolas do Abacatal e os moradores pobres, negros e pardos de Ananindeua.

Racismo na ditadura – O pesquisador do Numa ressalta que, durante a Ditadura Militar, os chamados grandes p     rojetos instalados na Amazônia atraíram para a região consideráveis levas de trabalhadores. Esses trabalhadores passaram a ocupar as periferias dos grandes centros urbanos após o encerramento de seus trabalhos, tornando-se potenciais vítimas do racismo ambiental, devido à vulnerabilidade que a mudança para esse novo território lhes impunha. “Principalmente quando percebemos que a maioria da população deslocada era formada por negros e pardos. Veja que bairros como o Guamá, Jurunas e Terra Firme receberam inúmeros grupos que foram desterritorializados de Tucuruí, Cametá, Baião e Mocajuba. Ainda hoje, os grandes projetos de monocultura estão expulsando a população negra do Marajó para Belém e do Planalto Santareno para as periferias de Santarém e Altamira”.

Ainda hoje, no âmbito da Região Metropolitana de Belém, o cientista aponta que o processo continua em ação: as recentes obras urbanas de Macrodrenagem do Tucunduba, da Estrada Nova ou da avenida Liberdade atingem os vulneráveis, que estão sendo duplamente atingidos, num processo histórico de exclusão. As áreas consideradas de risco são revitalizadas e acabam atendendo ao capital imobiliário, naquilo que os urbanistas chamam de gentrificação.

Educação no combate ao racismo – Sobre  possíveis medidas capazes de reduzir o racismo e suas diferentes formas, André Farias enfatizou  a necessidade de aumentar o conhecimento, pois acredita que a educação ajuda a acabar com a chaga social que é o racismo e sua versão ecológica, o racismo ambiental. Contudo considera necessário, ainda, dar visibilidade à luta por justiça ambiental de forma cada vez mais organizada e fortalecida, a exemplo, a Cúpula dos Povos. Finalmente, considera que essas lutas e resistências devem ganhar amplitude nas políticas públicas por meio de ações construídas coletivamente, com e pelas populações vulneráveis diretamente envolvidas.

Na COP 30, André Farias e Christian Nunes apresentaram as quase três décadas de serviço dedicadas      à questão ambiental pelo Núcleo de Meio Ambiente da UFPA. Conversaram sobre as pesquisas realizadas pelos grupos científicos e sobre as atividades de ensino desenvolvidas tanto no lato sensu, no caso do Profima, quanto no stricto sensu, com o Programa de Pós-Graduação em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia (PPGEDAM). Destacaram, ainda, os produtos científicos e tecnológicos produzidos no Numa, tanto em termos de processos inovadores e contribuições em política e legislação ambiental, como nas tecnologias aplicadas em colaboração com comunidades, entre as quais, as compostas por grupos que sofrem pelo racismo ambiental.

Para o pesquisador, a participação do Numa na COP 30 configura o prestígio institucional da UFPA. “Sem dúvida, nosso reitor, Gilmar Pereira, assim como as Pró-Reitorias, com destaque à Prointer, na pessoa da professora Lise Tupiassu, os institutos e os núcleos compostos de pesquisadores, pesquisadoras, técnicos e discentes de graduação e pós-graduação, todos estão ocupando papel central na COP 30. Temos      colegas em painéis, tanto na Zona Verde quanto na Zona Azul, temos voluntários trabalhando em todas as etapas e processos da construção deste momento histórico”.  Por fim, ele destaca a realização da Cúpula dos Povos no Campus da UFPA: “Um evento paralelo, com a cara de nosso povo amazônida. Tudo isso permitiu que a UFPA tenha se consolidado como uma verdadeira referência no mundo científico”, finaliza.

TEXTO: Walter Pinto - Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA

FOTOS: Alexandre de Moraes - Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA

Relação com os ODS da ONU:

ODS 13 - Ação Contra a Mudança Global do Clima

Leia também

Compartilhe

Facebook
Twitter
LinkedIn
Telegram
WhatsApp
Email
Print
Pular para o conteúdo