A União Nacional dos Estudantes (UNE) escolheu a Universidade Federal do Pará (UFPA) para realizar o primeiro ato da campanha nacional em defesa das cotas universitárias. O Ato “Eu Defendo as Cotas” ocorreu na última sexta-feira, 18 de março, em parceria com o Diretório Central dos Estudantes (DCE), o Conselho Estadual da Juventude e com demais representações estudantis. O debate contou ainda com o apoio da administração superior da UFPA, representada pelo reitor Emmanuel Zagury Tourinho e pela Assessoria de Diversidade e Inclusão Social (ADIS), na pessoa da professora Zélia Amador de Deus, referência do movimento negro no Pará.
A comunidade universitária reuniu-se no Complexo Recreativo Vadião, Campus Guamá, em Belém, para o debate “Eu Defendo as Cotas – Pela entrada e permanência na universidade”. Compuseram a mesa do evento: o reitor da UFPA, Emmanuel Tourinho; a professora Zélia Amador de Deus; a presidenta da UNE, Bruna Brelaz; o representante da UFPA na UNE, Tel Guajajara; a diretora do Conselho Estadual da Juventude, Ellana Silva; a representante da Associação de Estudantes Indígenas da UFPA (APYEUFPA), Putira Sacuena; e a diretora do DCE-UFPA e do Movimento Juntos, Tarsila Amoras.
O reitor iniciou os pronunciamentos e disse estar feliz com a escolha da UFPA para dar início à campanha, um reconhecimento da importância da luta dos movimentos sociais que levaram a UFPA a construir as suas políticas de ação afirmativa. Tourinho assinalou que a política de cotas será necessária por muitos anos para reparar as injustiças acumuladas na sociedade brasileira e que, por isso, a luta de grupos e movimentos sociais merece ser acolhida e ouvida. “É preciso registrar que quem mais ganha com a diversidade na universidade é a própria universidade. Da diversidade de origens, condições, raças e etnias vêm a diversidade de ideias, visões de mundo e contribuições para a nossa reflexão sobre a realidade do país. Uma universidade diversa está mais apta a contribuir com o desenvolvimento social”, apontou o reitor. “As cotas também contribuem para o cumprimento de nossa missão institucional de ‘Produzir, socializar e transformar o conhecimento na Amazônia para a formação de cidadãos capazes de promover a construção de uma sociedade inclusiva e sustentável’, ou seja, as cotas fazem a UFPA mais rica culturalmente e mais apta a refletir sobre a sociedade, promovendo as transformações necessárias em todos os espaços”, pontuou o reitor.
A professora Zélia Amador de Deus destacou que as cotas são um legado da UNE na luta por conquistas democráticas em todo o Brasil e que a reserva de vagas por grupo social é uma questão de classe e também de raça, dois dos principais pilares que sustentam o sistema capitalista, acrescido ao pilar de gênero, que sempre marginalizou pobres, negros e mulheres ao longo da história. Por isso, para a pesquisadora, a luta pelas cotas vem, com o tempo, combalindo o capitalismo e abrindo espaço para que os menos favorecidos também se destaquem na sociedade.
A professora Zélia trouxe ainda alguns dados que apontam a dificuldade de acesso à educação básica por negros e indígenas e, ainda, os problemas enfrentados para a conclusão do ensino médio por parte de estudantes quilombolas, de modo que, ao ofertar a reserva de vagas, a UFPA se coloca na vanguarda para a garantia dos direitos à educação dessa parcela da população, bastante numerosa no estado, sendo o Pará o terceiro do Brasil com maior número de comunidades quilombolas, estando atrás apenas da Bahia e do Maranhão. A diversidade, segundo a pesquisadora, é o que possibilita à Universidade gerar conhecimentos para além dos catedráticos, destacando também o legado da resistência de povos historicamente discriminados. “Por isso, enquanto o racismo e o classismo persistirem, é preciso haver cotas”, salientou.
Bruna Brelaz, a primeira estudante negra e nortista (de Manaus) a assumir a presidência da UNE, ressaltou o comprometimento da UFPA com a política de cotas e a importância para o movimento estudantil em ter a Instituição como aliada nessa luta, de modo que, para ela, é urgente que o Estado Brasileiro veja a educação como um dos pilares necessários ao desenvolvimento, passando também a incluir a Região Norte como estratégica para o país, não apenas no que consiste em fornecimento de mão de obra, papel historicamente imposto a negros e indígenas no país, mas também tendo-a como protagonista na formação e produção de conhecimentos, o que faz das cotas revolucionárias. “Com as cotas, o conhecimento também é gerado pelas mãos do povo negro e do povo indígena, que também tomam seu lugar na construção da ciência e na elaboração sociopolítica e econômica do país”.
Sem retrocessos – Para a presidenta da UNE, a campanha é o início de uma luta que vai contra o retrocesso e que, por isso, os estudantes não aceitarão a eliminação do critério racial da Lei n. 12.711/2012. Opinião compartilhada pelas estudantes Daiane e Danielen Costa, que são irmãs e estavam na plateia assistindo ao debate, ambas aprovadas por meio do sistema de cotas nos cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas e Educação Física da UFPA, respectivamente. “É muito importante falar sobre as cotas, porque, se estou aqui, hoje, na Universidade, foi por meio delas. Não podemos deixar que nos seja negado um direito que já adquirimos”, afirmou Danielen.
O estudante Tel Guajajara, primeiro estudante indígena a integrar a direção da UNE, em nome da representação estudantil da UFPA, declarou: "A comunidade universitária já está mobilizada, em conjunto com os centros acadêmicos e o movimento estudantil. Todos precisam conhecer a política de cotas, entender a sua importância. Queremos nacionalizar e popularizar o debate em favor das cotas e da democratização do acesso ao ensino superior, por isso a adesão de toda a diversidade da nossa comunidade é fundamental".
Para Putira Sacuena, representante da APYEUFPA, “as cotas nos dão a oportunidade de iniciarmos um diálogo de equidade dentro das universidades. A importância dessa ferramenta social é dizer que nós, povos Indígenas, somos fomentadores de ciências ancestrais e que buscamos o compartilhamento dessas ciências para um diálogo, vida e resistência de todos nós, povos Indígenas. As universidades estão sendo pintadas de urucum e jenipapo pela nossa presença. Que lutemos pela sua permanência, pois é a resistência para nossa existência”.
Também assistiram ao debate estudantes vinculados a movimentos estudantis. Estiveram presentes ainda dirigentes de unidades acadêmicas envolvidas na garantia da política de cotas da Universidade, como o pró-reitor de Extensão, Nelson de Souza Júnior, e o superintendente de Assistência Estudantil da UFPA, professor Ronaldo Araujo. Ainda marcaram participação no evento várias lideranças políticas paraenses.
Após o primeiro ato da campanha na UFPA, ao longo do ano, a UNE deve promover debates pela defesa das cotas em Mato Grosso, São Paulo, Bahia e em todos os estados onde o movimento estudantil estiver presente.
Apoio da Reitoria – O reitor Emmanuel Tourinho também recebeu a comissão organizadora da campanha em seu gabinete, com o pró-reitor de Extensão da UFPA, Nelson de Souza Júnior. Estiveram presentes a presidenta nacional da UNE, Bruna Brelaz; o diretor de cultura da UNE, membro do DCE e estudante indígena de Direito da UFPA, Tel Guajajara; o diretor regional da UNE, Alan Nunes; a diretora do Conselho Estadual da Juventude, Ellana Silva; e a estudante de pós-graduação em Educação Gabriela Esther.
Na ocasião, a presidenta da UNE apresentou as principais pautas da campanha e explicou a necessidade de mobilizar a sociedade para que a Lei de Cotas n. 12.711, criada em 2012, seja prorrogada. Após dez anos de vigência, a lei passará por um processo de revisão e o movimento da UNE visa demonstrar e firmar a vigilância da comunidade universitária quanto à continuidade das cotas e ao aperfeiçoamento da política que garantiu o ingresso de estudantes de escolas públicas; oriundos de famílias com baixa renda; pretos, pardos e indígenas; e pessoas com deficiência (PcD) em processos seletivos das universidades federais por meio da reserva legal de vagas.
O reitor Emmanuel Tourinho explicou que a UFPA possui uma política de reserva de vagas que antecede a Lei de Cotas. Além das reservas de vagas para cotas implementadas desde o processo seletivo de 2008, a Federal paraense, desde 2011, de forma pioneira, destina duas vagas de cada curso de graduação para indígenas e quilombolas, ofertadas em processo seletivo especial. Desde 2019, também é ofertada uma vaga adicional em cada curso do vestibular para estudantes com deficiência. E, mais recentemente, criou um processo destinado a estrangeiros em vulnerabilidade socioeconômica (refugiados, apátridas, asilados e vítimas do tráfico de pessoas), o PSE-Migre, por meio do qual possui atualmente cinco estudantes indígenas da etnia Warao, oriundos da Venezuela.
Texto: Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA
Fotos: Alexandre de Moraes – Ascom UFPA