Cientistas da UFPA transformam resíduos da mineração em tecnologia capaz de remover poluentes dos rios

A Amazônia é o bioma brasileiro mais atingido pela mineração, conforme mapeamento realizado pelo MapBiomas, ainda em 2020, que apontou como 149.393 dos 206.100 hectares de terras mineradas no Brasil estavam em território amazônico. Tamanho impacto não ocorre sem consequências, e a contaminação dos ecossistemas aquáticos locais por rejeitos e metais pesados, como o mercúrio e o cromo, é apenas um dos danos ambientais causados pela extração mineral. A procura por soluções para este cenário levou uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) a realizar um estudo que aponta que é possível transformar rejeitos da mineração em materiais capazes de remover poluentes da água

Segundo o professor do Instituto de Geociências (IG) Dorsan Moraes, químico e coordenador da pesquisa, o objetivo inicial do estudo era investigar o uso de resíduos minerais para o desenvolvimento de tecnologias que minimizassem impactos oriundos de desastres naturais ou poluição de recursos hídricos. Em outras palavras, pretendia-se transformar um problema ambiental significativo no norte do Brasil – o acúmulo de resíduos minerais – em parte da solução para a despoluição dos rios amazônicos. 

“Com o aumento da mineração no estado do Pará, há, consequentemente, o aumento da disposição de resíduos dos diversos processos de beneficiamento dos minerais alvos, o que, por atuação de um sinistro, podem vir a poluir o ar, o solo e, principalmente, a água, diminuindo sua qualidade, ocasionando a redução da população marinha e, consequentemente, da pesca. Criando novos processos de redução da poluição, surgem novas alternativas e de mais baixo custo que as atuais disponibilizadas, de forma a manter os rios saudáveis e, com isso, a população que depende dele, para sustento, agradece”, afirma Dorsan Moraes, que coordenou a pesquisa.

Fotografia posada de um grupo de pesquisadores. Eles estão dentro de um laboratório, vestidos com jalecos brancos.

Desta forma, a investigação, que também contou com a participação de professores pertencentes a diversas áreas de pesquisas interligadas ao projeto e estudantes de pós-graduação, graduação e iniciação científica, apontou potenciais “despoluidores” nos resíduos de vermiculita e nos rejeitos da mineração de manganês. Com base neles, dois tipos de materiais foram sintetizados em laboratório: a vermiculita ativada com sódio e a fase tipo Shigaite LDH

Perigos associados aos poluentes – O azul de metileno, um composto sintético amplamente utilizado como corante têxtil que muda a cor dos rios, prejudica a entrada de luz e reduz o oxigênio disponível para peixes e plantas. O cromo, um metal pesado com potencial carcinogênico, também causa sintomas graves, como sangramentos em pessoas intoxicadas. Já o manganês, em concentrações elevadas, está associado a doenças como Alzheimer e a outros distúrbios neurodegenerativos.

Neste contexto, tanto a vermiculita ativada com sódio quanto a fase tipo Shigaite LDH passaram por experimentos que simulam situações reais de contaminação dos rios amazônicos e obtiveram melhores resultados quando a vermiculita ativada com sódio interagiu com o azul de metileno e a fase tipo Shigaite LDH interagiu com um íon de manganês e com o cromo. Na ocasião, atuando como adsorvedores dos agentes poluidores, a vermiculita ativada removeu 99% do azul de metileno; enquanto a fase tipo Shigaite LDH HDL removeu 97% do cromo e 100% do manganês.

Essa descoberta dos pesquisadores não só é capaz de reduzir consideravelmente o teor dos poluentes na água e no meio ambiente, como também conta com outro ponto relevante a seu favor: o menor custo de produção em relação aos métodos de despoluição tradicionais, como peneiras moleculares e os próprios adsorvedores comerciais. “Além da despoluição, temos também a redução de resíduos que podem ser carregados para os rios, lembrando que o processo de despoluição é mais viável na saída das águas de despejo das mineradoras, evitando o problema na fonte”, acrescenta Dorsan Moraes. 

Segundo o professor, com a publicação dos resultados dessa etapa da pesquisa, o objetivo agora é investigar novos materiais residuais dispostos na biota amazônica e buscar parcerias com empresas do setor que ajudem a transformar o protótipo de laboratório em uma tecnologia adaptada para contextos mais amplos.

“A principal importância trata do uso de rejeitos diversos, principalmente da mineração, para desenvolvimento de novos materiais para atuarem como adsorvedores de poluentes, o que vem a reduzir custos de produção desses compostos já que são de origem natural, bem como ajudar na própria diminuição desses resíduos, transformando o que era lixo em nicho de mercado para as próprias empresas”, destaca. 

Os resultados do Projeto de Pesquisa “Uso de resíduos minerais e/ou minerais filossilicatos para produção de novos materiais ou desenvolvimento de tecnologia para minimização de impactos oriundos de desastres naturais ou poluição de recursos hídricos” foram publicados na Revista REM – International Engineering Journal em agosto. Confira o artigo na íntegra aqui

TEXTO: Gabriela Cardoso - Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA

FOTOS: Alexandre de Moraes e Arquivo pessoal

Relação com os ODS da ONU:

ODS 4 - Educação de QualidadeODS 6 - Água Potável e SaneamentoODS 9 - Indústria, Inovação e InfraestruturaODS 12 - Consumo e Produção ResponsáveisODS 14 - Vida na Água

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