O evento “Vozes do Rio: Saberes, Vivências e Adaptação das Famílias Ribeirinhas diante da Crise Climática”, atividade não oficial da COP 30, reuniu pesquisadores e ribeirinhos no Núcleo de Teoria e Pesquisa do Comportamento (NTPC) para ampliar suas vozes, promover reivindicações e fomentar reflexões sobre os impactos das mudanças climáticas em suas comunidades.
Os principais temas debatidos no evento foram sobre o saneamento e a saúde das famílias ribeirinhas. Vania Neu, docente do Programa de Pós-Graduação em Aquicultura e Recursos Aquáticos Tropicais da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), destacou que o esgotamento sanitário inadequado, as moradias precárias, o acesso limitado à energia elétrica e a insegurança hídrica e alimentar são desafios cotidianos que afetam tanto o meio ambiente quanto a saúde das comunidades.
Assim, para garantir a permanência dos ribeirinhos em suas comunidades, é necessário ampliar a atenção às suas condições de vida. “Se quisermos manter a floresta em pé, precisamos cuidar das pessoas que cuidam dela. Sem acesso ao básico como água, saneamento e educação, não é possível mantê-las no território”, pontuou Vania.

A docente apresentou soluções de baixo custo baseadas na natureza para o tratamento de esgoto doméstico, destacando o sistema de evapotranspiração. Nesse modelo, o esgoto é tratado pela ação conjunta de microrganismos e plantas, que decompõem e absorvem os resíduos, enquanto a água é devolvida à atmosfera por meio da transpiração das folhas, contribuindo para a ciclagem hídrica e de nutrientes.
Ela também explicou como é possível tratar a água da chuva e torná-la potável para uso doméstico e consumo, utilizando caixas d’água para captação e hipoclorito de sódio para a desinfecção. “É uma tecnologia simples e barata que faz com que a gente consiga levar água para a casa das pessoas. Porque não podemos esquecer que, na Amazônia, vivem pessoas, e a conservação e a manutenção dos rios e dos estoques de carbono dependem das condições mínimas para que os povos das águas e das florestas possam continuar com o seu papel”, pontuou a professora da Ufra.
Segundo Norma Miranda, do Instituto de Direitos Humanos Dom José Luís Azcona, a ciência é fundamental para entender como os problemas atuais podem gerar impactos a longo prazo. No entanto ela ressalta que não basta apenas produzir conhecimento, é preciso agir e garantir que a pesquisa avance com ações eficientes e contínuas.

A debatedora destacou, ainda, que muitas pesquisas e organizações lucram com as pautas ribeirinhas, enquanto as próprias comunidades ficam responsáveis por “cuidar do mundo” sem que ninguém cuide delas. “Depois de todo mundo devastar, escravizar e acabar com tudo, agora nós temos que carregar o mundo? Não, senhor! Vamos fazer a nossa parte, mas, para isso, precisamos de educação, saúde, respeito e dignidade. São muitas as contradições que temos que enfrentar no nosso dia a dia”, contou Norma.
Do outro lado do rio Guamá, Graciete Cardoso, agente comunitária da Unidade Básica de Saúde (UBS) do Combu, falou sobre o atendimento e o acolhimento oferecidos à população por uma equipe multiprofissional composta por 18 profissionais. Ela ressaltou, porém, que a contaminação da água tem impedido o uso ancestral do rio. “A água, pra gente, é vendida no barco-pipa, uma água potável de origem duvidosa, mas é a opção que temos porque não podemos mais pegar do rio, como era feito pelos nossos ancestrais”, explica.
Outro problema citado pelos participantes foi a questão da segurança. Lanchas e até mesmo policiais passam em alta velocidade e derrubam quem está em barcos menores. “Quando pedimos ajuda, eles sempre dão uma desculpa, nunca tem ninguém, só quando tem grandes eventos ou pessoas famosas. E quando vão para fazer a segurança dessas outras pessoas, entram em alta velocidade e saem derrubando tudo”, comentou Jamilly, uma das participantes do evento.
Ao fim do debate, Jonas Carvalho e Silva, professor do Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento da Universidade Federal do Pará (UFPA), comentou a importância de disponibilizar esse espaço para a escuta das comunidades. “Eventos como este são importantes para perceber como essas mudanças têm nos impactado na perspectiva individual e na contextual, envolvendo os sistemas como escolas, universidade e saúde. Que, com essa interlocução, a gente possa apoiar as comunidades e a diversidade das regiões existentes”, concluiu.
