A Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade Federal do Pará (UFPA) inaugurou, na última segunda-feira, 17, a Exposição “Produção da Casa Palafita”, iniciativa que apresenta o processo de concepção e construção de um protótipo arquitetônico inspirado nas habitações vernáculas das regiões ribeirinhas da Amazônia. O projeto integra uma colaboração franco-brasileira que, no contexto da COP 30, busca refletir sobre soluções sustentáveis e resilientes diante dos desafios sociais, ambientais e climáticos contemporâneos.
A exposição marca a finalização da primeira etapa de um amplo trabalho coletivo voltado ao habitat amazônico, reunindo estudantes, docentes, artesãos e instituições de ambos os países. O protótipo construído no campus da UFPA representa uma experiência concreta de experimentação, pesquisa e diálogo entre diferentes saberes (científicos, tradicionais e comunitários).
Segundo o professor José Júlio Lima, vice-diretor da FAU, a iniciativa nasceu de uma aproximação entre o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) e o Conselho Nacional da Ordem dos Arquitetos da França (CNOA). Com esse diálogo, foi feito o convite para que a UFPA integrasse uma parceria com a instituição francesa e com a Escola Nacional Superior de Arquitetura de Paris-Belleville (Ensa-PB).
“A ideia inicial era que construíssemos uma edificação ribeirinha, e chegou a se pensar em realizá-la em uma área urbana ou de igarapé. Propusemos, então, que fosse construída próximo ao prédio da FAU, em uma zona que, embora não fosse permanentemente alagada, reproduz condições semelhantes durante o período chuvoso”, explicou o vice-diretor.

O projeto contou com a participação de três estudantes franceses, que se integraram às turmas da FAU e, com base nas pesquisas de campo e visitas ao interior guiadas pelo arquiteto do “Laboratório da Cidade” – um tipo de Organização Não Governamental que se dedica a trabalhar com arquitetura e urbanismo de Belém –, foi possível desenvolver o desenho arquitetônico em colaboração com professores brasileiros, franceses e artesãos locais. Durante quatro meses, foram realizadas as etapas de estudo do território, concepção e preparação para o canteiro participativo, no qual os próprios alunos construíram o protótipo.
“O produto disso foi que os alunos mesmo ‘meteram a mão na massa’, como a gente chama, e construíram a Palafita”, relembrou o professor. “O objetivo desse projeto foi ter um campo de experimentação e mostrar a realidade do sistema construtivo. É uma obra em evolução: durante o período letivo, os estudantes poderão modificar painéis e experimentar novas soluções”, destaca José Júlio.

Saberes tradicionais e a força da madeira amazônica – A participação dos artesãos foi fundamental para o processo, especialmente a atuação de José Valdo Aires Pantoja, responsável por orientar e coordenar os discentes durante a construção da obra. Para ele, o projeto evidencia a importância da madeira amazônica e o conhecimento necessário para seu uso responsável.
“O Projeto da Casa Palafita tem tudo para crescer. Ele pode ser reproduzido em outras universidades, porque arquitetos e engenheiros precisam entender como trabalhar com a madeira. Nossa floresta tem vários tipos de madeira, cada uma com sua função”, apontou o artesão.
A fundação da estrutura reúne espécies como maçaranduba, ipê, angelim e cumaru, entre outras madeiras amazônicas, destacando a diversidade e a resistência dos materiais. José Valdo também ressalta o papel pedagógico e social da iniciativa. “Projetos como esse mostram às Nações Unidas por que a madeira é extraída no Pará e no Brasil: não para fins predatórios, mas para atividades essenciais à subsistência das populações, como a carpintaria naval e civil. As casas de palafitas dos ribeirinhos e até as embarcações dependem desse conhecimento e assim podemos perceber, por meio de um projeto como esse, a importância da madeira”, concluiu José Valdo.
Arquitetura amazônica para o futuro – A Exposição “Produção da Casa Palafita” apresenta não apenas um objeto arquitetônico, mas também um processo vivo, aberto e contínuo. O protótipo é resultado de uma construção interdisciplinar que reúne arquitetura, engenharia, paisagem, saberes tradicionais e técnicas contemporâneas, representando um laboratório de possibilidades para o futuro da habitação na Amazônia. O projeto abre caminho para novas pesquisas sobre materiais amazônicos de base biológica, sistemas construtivos leves e resilientes e metodologias pedagógicas voltadas à arquitetura consciente do território. Trata-se de imaginar, com base nas tradições, um futuro sustentável e enraizado no contexto amazônico – uma arquitetura que dialogue com o rio, o clima e com as comunidades que aqui vivem.


