Professores da Universidade Federal do Pará e gestores das Secretarias de Estado de Ciência, Tecnologia e Educação Profissional e Tecnológica e de Articulação da Cidadania debateram, com lideranças do bairro Guamá, a relação existente entre o direito à cidade, a regularização fundiária e o Projeto “Meu endereço: lugar de paz e segurança social”. A atividade ocorreu no dia 14 de novembro, na Seccional do Guamá, localizada na Avenida Tucunduba, e resgatou a evolução das cidades desde as populações nômades até o surgimento das primeiras cidades em torno dos rios e das estradas.
Durante o encontro, foi mostrado um diagnóstico de conflitos fundiários urbanos ocasionados pelo desenvolvimento desordenado dos territórios ao longo da história, assim como os desafios colocados pela ausência de políticas públicas mais efetivas na Região Metropolitana de Belém (RMB) e os seus efeitos prejudiciais sobre os direitos constitucionais das comunidades, embora a tributação federal, estadual ou municipal não deixa de ser feita em cada aquisição de mercadoria ou serviço no mercado.
Myrian Cardoso, professora da Faculdade de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFPA e coordenadora do Projeto Meu Endereço, explicou que o projeto integra o esforço do Governo do Estado do Pará e de mais 27 secretarias para a redução da vulnerabilidade social e o enfrentamento das dinâmicas da violência, por meio do Programa TerPaz, nos territórios do Icuí-Guajará, em Ananindeua, Nova União, em Marituba, e nos territórios do Jurunas, do Guamá, da Terra Firme e da Cabanagem, em Belém.
Desafios fundiários – Segundo ela, a Comissão de Regularização Fundiária da UFPA realizou estudos em 1.935 lotes existentes nos bairros do entorno da Universidade Federal do Pará e constatou-se que cerca de 71% dos lotes (1.366 terrenos) têm desconformidades urbanísticas, conforme legislação municipal vigente. Mais de 700 lotes (38%) são passíveis de alagamento e carecem de melhorias sanitárias e 973 terrenos (50%) não possuem delimitação de muro ou cerca, gerando a expectativa de conflitos vicinais e fundiários entre os moradores. Cerca de 90% dos conflitos entre vizinhos decorrem de questões fundiárias, construtivas, instalações sanitárias ou de realização de obra. Além disso, 50% dos lotes não têm delimitação de muro e 53% deles apresentam moradias que necessitam de melhorias.
Com esse cenário local, tornaram-se mais claros os desafios fundiários colocados pelo uso da terra e pelo crescimento das cidades amazônicas. Assim, o Projeto Meu Endereço torna-se uma ferramenta inclusiva e contribui para a redução do índice de conflitos socioambientais urbanos nos sete territórios, buscando fortalecer a capacidade do Estado para atuar na assistência técnica multiprofissional e promover, com a participação da comunidade, ações educacionais que compartilhem um suporte técnico e tecnológico para a elaboração de peças técnicas do Kit Meu Endereço Certo. Essas peças são fundamentais para a garantia do direito social à moradia e o acesso à cidade de forma legalizada.
Kit Meu Endereço – O Kit é composto pela planta de localização do imóvel, planta de limite de lote, laudo das condições socioambientais da moradia, laudo de avaliação do imóvel e guia de encaminhamento a programas sociais do Governo do Estado. Segundo Cleiton Costa, geógrafo do Projeto Meu Endereço, o artigo 182 da Constituição Federal de 1988 garante que a política de desenvolvimento urbano tem por finalidade ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.
Além disso, acentua o pesquisador, o Estatuto da Cidade também assegura a garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para a presente e as futuras gerações. “O curso livre promove este intercâmbio de conhecimentos com a comunidade e desconstrói conceitos que não valorizam os direitos, os deveres e a participação efetiva da comunidade como chave de acesso à cidade”, destaca.
Dinâmica do curso – Durante o curso livre, os participantes receberam um mapa dos limites do bairro Guamá e foram estimulados a localizarem as suas ruas e moradias na planta do território. A líder comunitária Rosa Maria de Souza, que acreditava residir há 30 anos no bairro Guamá, inclusive recebendo a conta de luz como moradora desse território, descobriu que, na verdade, a sua residência e o seu endereço estão localizados no bairro Universitário. “Como pode isso? Vou continuar dizendo que pertenço ao bairro do Guamá”, assinalou sorrindo.
Por sua vez, Harilson Carlos, 21 anos, desempregado e morador da Rua Augusto Correa, 1.214, disse que ampliou os seus conhecimentos. “Aprendi muito nesta interação com a comunidade. As informações apresentadas pelas equipes da UFPA foram essenciais para construir novos conceitos sobre a cidade e o território. Isso me estimula a participar para construir soluções coletivas para a comunidade”, finalizou.
Texto e fotos: Kid Reis – Ascom CRF/UFPA