Memória, Restauração e Democracia: documentário sobre os ataques do 8 de janeiro é exibido em prédio histórico dos Mercedários

Depoimentos de testemunhas de um dos episódios mais degradantes ao regime democrático brasileiro abrem o documentário 8 de Janeiro: Memória, Restauração e Democracia. Na capital paraense, a projeção do filme foi no complexo histórico dos Mercedários, que, atualmente, passa por um processo de restauro.

Para a professora Thais Sanjad, coordenadora do Laboratório de Conservação, Restauro e Reabilitação (Lacore/UFPA), proporcionar essa exibição no espaço tem um  simbolismo muito especial. “Trazer para cá a relevância da salvaguarda do nosso patrimônio é muito significativo. É uma forma de homenagear o trabalho do profissional restaurador-conservador no meio do turbilhão que foi esse capítulo triste da nossa história”, ressalta.

O documentário mostra, em detalhes, todo o contexto envolvido, os primeiros momentos após a depredação das estruturas do Palácio do Planalto, na capital federal: vidraças estilhaçadas, objetos destruídos, peças quebradas pelo chão, e, principalmente, o impacto que isso tudo causou nas pessoas. Destaque para a atuação das equipes empenhadas no trabalho de recomposição do patrimônio vandalizado. Cada obra reconstituída é mostrada sob a perspectiva dos restauradores. Os relatos contam muito do que foi feito e, com base neles, é possível constatar que, além de tintas e produtos químicos, as lágrimas desses profissionais fizeram parte dos materiais que recompuseram as obras de arte. 

Uma das falas mais comoventes é a de Andrea Bachettini, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), coordenadora do Projeto de Restauração. Ela esteve acompanhada de Michael Kerr (UFPel), diretor do filme, para uma interação com o público após a exibição do documentário, em Belém. “No meu trabalho, pesou muito não apenas a questão técnica em si, mas também o meu lado cidadã. Eu amo o que faço e costumo imprimir isso na restauração. Aquele momento traduz todo o sentimento que as nossas equipes tiveram testemunhando a destruição de coisas que, pra nós, são muito valiosas, e para a sociedade também”, salienta a docente. 

Para Kerr, as cenas não apenas evidenciam o trabalho de reconstituição de objetos, mas também trazem uma reflexão fundamental sobre o papel da preservação do patrimônio cultural na defesa da democracia. “Quando começamos as filmagens, estávamos muito impactados com o que havia acontecido, mas, sobretudo, tínhamos a missão de traduzir os fatos em imagens. Nossa preocupação era, principalmente, como traríamos isso para as pessoas”, pontua. Segundo ele, o maior desafio era, justamente, a mensagem que estava sendo passada. “O produto audiovisual, de certa forma, mexe com os nossos sentidos, daí a importância de sensibilizar o público, que não poderia estar ali e acompanhar de perto aquela situação”, explica.

fotografia REGISTRA UMA GRANDE PLATEIA, DE COSTA, ATENTA A UM TELÃO QUE REPRODUZ IMAGENS DE UMA FILME.

O filme é uma produção da UFPel, por meio do curso de Cinema e Audiovisual e do Laboratório Aberto de Conservação e Restauração de Pintura (Lacorpi), do curso de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis – UFPel, em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e a Diretoria Curatorial dos Palácios Presidenciais (DCPP).

Durante o encontro, os membros da equipe técnica e acadêmica responsável pela restauração compartilharam experiências sobre o trabalho realizado no Palácio da Alvorada e discutiram as implicações simbólicas e democráticas da preservação do patrimônio cultural brasileiro. 

Para Júnior-Kostas, professor de Cerâmica e Escultura da Faculdade de Artes Visuais, da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), o documentário consegue unir os trabalhos minuciosos de restauração, a valorização da memória e o clamor pela democracia de uma forma poética e também altamente educativa. “As estratégias e as abordagens de restauração são apresentadas de forma a envolver o espectador em um processo de conscientização acerca do valor do nosso patrimônio artístico e cultural. Os desdobramentos para a educação patrimonial na educação básica, também achei relevantes e de grande importância para a conscientização das novas gerações”, concluiu o docente, ao mencionar a etapa de inclusão de alunos da escola básica no processo de restauro coordenado pela UFPel.

Segundo os organizadores do encontro, a iniciativa busca sensibilizar a comunidade acadêmica e o público em geral sobre os eventos de 8 de janeiro de 2023, fortalecendo a compreensão de que a restauração das obras vai além da preservação material: representa também um gesto de resistência, reconstrução simbólica e fortalecimento dos valores democráticos.

TEXTO: Ana Teresa Brasil - Ascom Movimento Ciência e Vozes da Amazônia na COP 30

FOTOS: Divulgação

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