Mesa-Redonda destaca Cafi Parentinho e  protagonismo infantil indígena na luta por educação e clima

Na tarde da última quinta-feira,13, a Aldeia COP, sediada na Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará (UFPA), promoveu a Mesa “A Experiência de Formação do Cafi Parentinho com o objetivo de melhorar a qualidade da educação nas aldeias indígenas da Amazônia Brasileira”. O encontro se destacou não apenas pelo conteúdo apresentado, mas também pela composição da mesa, formada por lideranças indígenas e pelos chamados “delegados mirins”, crianças que integram o Centro Amazônico de Formação Indígena (Cafi). A atividade ecoou as vozes das infâncias da floresta, de crianças que já vivenciam os efeitos das mudanças climáticas em seus territórios e que têm muito a dizer sobre o presente e o futuro das comunidades indígenas.

O coordenador-geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Toya Manchineri, da etnia Manchineri do território Maodate (Acre), apresentou o histórico e os objetivos que levaram à criação do Cafi, e, posteriormente, do Cafi Parentinho. Segundo ele, a iniciativa nasce de um sonho coletivo que começou há duas décadas. “O Cafi tem uma história muito importante na nossa vida e na das lideranças: 20 anos atrás, nós sonhamos em construir a primeira universidade dos povos indígenas da Amazônia Brasileira. Mas, naquele tempo, nós não sabíamos e não conhecíamos como funcionava a estrutura do Estado. Não sabíamos que tinha que ter doutor, mestre, recursos e toda uma área técnica para criar uma universidade. E, então, não deu pra gente construir a nossa, mas criamos nosso centro de formação”, relembrou o organizador. 

Com essa mobilização, o Centro Amazônico de Formação Indígena passou a ofertar cursos voltados à gestão, ao meio ambiente, à proteção territorial e ao mercado de carbono. De acordo com o coordenador, o espaço foi criado para que as lideranças pudessem fortalecer sua autonomia por meio do conhecimento.

A criação do Cafi Parentinho surgiu de uma demanda específica das mulheres indígenas, que buscavam participar de espaços de luta por direitos e formação, sem precisar se afastar de seus filhos. Para o coordenador, o espaço ultrapassa a dimensão comunitária e se consolida como ambiente político, cultural e formativo desde a infância. “Com esse desafio, o Cafi construiu um espaço que acolhe, forma e valoriza os saberes tradicionais que as crianças trazem dos seus territórios, um espaço que reconhece que a formação política e cultural começa na infância. Assim nasce o Cafi Parentinho em 2024”, explicou Toya.

O nome do projeto também carrega um significado profundo. A palavra “Parentinho” deriva de “parente”, forma como os povos indígenas se reconhecem entre si. O diminutivo, segundo Toya, reforça o pertencimento das crianças: “O nome simboliza um espaço de formação, um berço da família indígena, onde todos são parentes e onde reafirmamos uma sabedoria ancestral. Para educar uma criança, é preciso uma aldeia inteira”, completou.

Entre os principais objetivos da iniciativa, Toya Manchineri listou a ampliação da participação das mulheres indígenas em espaços de decisão; a criação de um ambiente seguro, acolhedor e formativo para as crianças e o fortalecimento do diálogo intercultural desde a infância. “O Cafi Parentinho é fundamental para o movimento indígena, porque possibilita que as mulheres participem plenamente das formações, reuniões e mobilizações sabendo que seus filhos estão em um espaço seguro, cuidadoso e restritivo”, ressaltou. 

Para ele, a formação das crianças é também parte essencial de um futuro de autonomia: “É muito importante repassar os conhecimentos da aldeia, da comunidade originária para as crianças, porque são elas que vão carregar isso para o futuro e levar para outras crianças, para que elas possam, no futuro, ser agentes transformadores da sua realidade, do seu povo, da sua comunidade”, destacou Manchineri.

fOTOGRAFIA REGISTRA UM GRUPO DE CRIANÇAS INDÍGENAS. UMA DESSAS CRIANÇAS, UMA MENINA, FALA AO MICROFONE.

Outro ponto discutido na mesa foi o Manifesto “A Resposta Somos Nós”, elaborado pelas crianças do Cafi Parentinho. O documento nasceu após os pequenos relatarem mudanças climáticas percebidas diretamente em seus territórios. “As crianças, ao observarem o mundo ao seu redor, começaram a falar sobre o que viam e sentiam em seus territórios, as mudanças no clima, os rios secando, as florestas desmatadas. Dessas reflexões, nasceu o Manifesto das crianças ‘A Resposta Somos Nós’, um documento histórico, escrito e revisado, em grande parte, por crianças”, explicou Toya Manchineri.

Trechos do manifesto foram lidos durante a mesa pelos delegados mirins. Entre as mensagens, as pequenas vozes afirmaram: “Nós, as crianças indígenas da Amazônia e do mundo, somos a voz da terra que nunca se cala e a raiz que segura o futuro. Estamos aqui para cuidar do nosso mundo, da nossa floresta e principalmente do nosso direito de existir. A p0 é nossa mãe e precisa ser cuidada; quando ela sofre, nós também sofremos juntos. E, agora, pedimos que os adultos – enquanto vocês conseguem ouvir – escutem o nosso chamado. Somos parte da solução. Sempre falam que somos o futuro, mas somos o presente e o agora.”

A mesa também contou com a participação de Capitu Maciel, analista de Natureza do Instituto Alana, que destacou a urgência de incluir as crianças na tomada de decisões relacionadas ao clima. “Não precisa dar voz às crianças, elas já têm voz. Os adultos é que precisam dar ouvidos a elas”, afirmou a analista. Para ela, as infâncias são, atualmente, o grupo mais afetado pela crise climática global. “Elas já sofrem no presente, não é mais sobre o futuro”, analisou a especialista. Capitu destacou, ainda, que, além de vulneráveis por seu próprio processo de desenvolvimento, as crianças são vulnerabilizadas por estruturas adultocêntricas que, historicamente, as invisibilizam. “Nós não fomos acostumados a ouvir as suas vozes, mas elas sempre estiveram lá”, concluiu a palestrante.

Mais informações sobre o trabalho do Cafi e da Coiab estão disponíveis no site oficial da organização.

TEXTO: Tahis Cristine - Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA

FOTOS: Tahis Cristine - Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA

Relação com os ODS da ONU:

ODS 4 - Educação de Qualidade

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