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TAMANHO DA FONTE

Neurocientista Sidarta Ribeiro fala sobre o uso potencial de substâncias psicoativas para o tratamento de diferentes doenças

Referência no estudo de substâncias psicoativas na Medicina, o neurocientista e biólogo Sidarta Ribeiro falou para um auditório lotado durante a programação científica da 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Pós-Doutor em Neurofisiologia, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e membro do Grupo de Pesquisa de Saúde Mental do Centro de Estudos Estratégicos (CEE) da Fiocruz, o pesquisador fez um apanhado sobre o cultivo da maconha na história da humanidade e o seu uso potencial para o tratamento de diversas doenças, na Conferência “As flores do bem”.

O neurocientista iniciou a conferência lembrando de uma série de práticas afro-indígenas que estão ligadas à vinda da diáspora africana para o Brasil e que, tal qual o uso da maconha, sofreram um histórico de perseguição. Uma lógica que faz entender o processo que levou à criminalização da planta Cannabis sativa. “Quem trouxe o cânhamo para o continente americano foram os europeus, mas quem trouxe a maconha como remédio foram as populações africanas escravizadas, que já conheciam a maconha como remédio há milênios, que já faziam uso da maconha de várias maneiras diferentes, seja como unguento, emplastro, seja a maconha fumada”, pontuou. “E, no Brasil, isso se tornou um hábito extremamente comum. Até os anos 20, era muito comum que as pessoas se reunissem para fumar o ‘Pito do Pango’ ou a liamba, e havia uma crítica da população branca de dizer ‘olha como isso torna os pretos preguiçosos’. Essa é uma crítica racializada, de opressão, que claramente coloca as pessoas na condição de robôs”.

Sidarta destacou que existem mais de mil variedades da planta, sendo dois grandes tipos, um que produz uma ótima fibra, o cânhamo, usado para a produção de cordas, roupas; e outro tipo, rico em resinas terapêuticas e também várias outras substâncias não psicoativas. Dentro dessa variedade de substâncias, o pesquisador destaca que existem na planta, potencialmente, 500 moléculas de interesse. “A maconha foi, provavelmente, a primeira planta a ser domesticada, há 12 mil anos, numa região da China, que coincide com aquilo que a arqueologia já dizia, de que, provavelmente, a maconha viria daquela região”, pontuou. “E o conhecimento sobre as propriedades terapêuticas da maconha é muito antigo – isso aqui é um papiro de 1550 antes de Cristo, fazendo uma prescrição da maconha, no Egito, para inflamação – e, de fato, existe farta evidência científica de que são potentes anti-inflamatórios. Claro que nada serve para tudo, existem pessoas que não podem consumir Cannabis ou algumas de suas moléculas, mas, de fato, é uma planta com muitas indicações terapêuticas diferentes”. 

Ainda que o uso da planta para diferentes efeitos terapêuticos seja muito antigo, inclusive havendo evidências arqueológicas de uso da maconha, Sidarta Ribeiro lembrou que ela foi criminalizada em um determinado contexto histórico, mundial. “Entre os anos 20 e 30, a maconha saiu de uma situação de legalização, ela estava nas farmácias, e veio esse pânico moral que criou a aversão que muitas pessoas têm à maconha até hoje. Isso tem a ver com a campanha feita pelos Estados Unidos, sobretudo”, colocou, ao pontuar em que momento esse cenário começou a ser rediscutido. 

“O debate começou a mudar com a redescoberta de que a maconha é um excelente antiepilético, sobretudo o canabidiol. Ficou impossível para os proibicionistas dizerem que a maconha não serve para nada na Medicina. Isso fez muita gente mudar de ideia”, concluiu.Hoje, alguns estudos existentes já demonstram a eficácia da Cannabis para diferentes usos, mas o neurocientista destaca que ainda é preciso avançar não só nas pesquisas, mas também, sobretudo, em uma reparação. “Se a gente entende que a maconha foi duramente perseguida e que as populações periféricas, as pessoas negras e faveladas deste país foram injustamente perseguidas por causa da maconha, elas precisam de reparação, de desencarceramento, e a gente precisa fazer uma coisa que foi feita em Nova Iorque, que é favorecer que os negócios da maconha legalizada estejam nas mãos das pessoas que mais sofreram”.

TEXTO: Comissão Local de Comunicação da 76ª da Reunião Anual da SBPC

FOTOS: Comissão Local de Comunicação da 76ª da Reunião Anual da SBPC

Relação com os ODS da ONU:

ODS 3 - Saúde e Bem-Estar

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