Pesquisadores da Amazônia desenvolvem protocolo para coletar e inventariar insetos aquáticos

Um grupo de 28 pesquisadores de todos os estados da região da Amazônia Legal elaborou um protocolo inédito para o inventário de insetos aquáticos no sistema Rapeld (Inventários Rápidos em Projetos Ecológicos de Longa Duração), a fim de solucionar a falta de padronização nos métodos de coleta – um dos principais desafios para o monitoramento da biodiversidade.

O foco da proposta são os grupos Ephemeroptera, Plecoptera, Trichoptera, Odonata e Heteroptera (EPTOH), reconhecidos como bioindicadores da qualidade ambiental de ecossistemas de água doce. A proposta reúne procedimentos replicáveis que permitem gerar séries temporais e espaciais robustas, fundamentais para a compreensão dos efeitos das mudanças climáticas e das atividades humanas sobre os ecossistemas aquáticos e que são essenciais para orientar estratégias de conservação eficazes, como a descrição detalhada de equipamentos, métodos de coleta, delineamento amostral e métricas ambientais. O protocolo também apresenta recomendações práticas para pesquisadores em início de carreira, gestores ambientais e tomadores de decisão.

“A padronização é um passo essencial para avançarmos na compreensão da biodiversidade aquática e subsidiarmos políticas públicas de conservação”, explica o coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Síntese da Biodiversidade Amazônica (INCT SinBiAm), professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará (UFPA) e bolsista de Produtividade em Pesquisa (PQ) do CNPq Leandro Juen, que liderou o estudo ao lado da professora da Faculdade de Ciências Biológicas da UFPA e bolsista de Produtividade em Pesquisa (PQ) do CNPq Karina Dias Silva.

Segundo os pesquisadores, esforços amostrais diferentes dificultam a integração de dados e a realização de análises em grande escala. Eles explicam que a adoção de metodologias unificadas tornará possível a geração de séries históricas confiáveis e que sua implementação em toda a região amazônica possibilitará a realização de estudos em grande escala, promovendo uma visão integrada da estrutura e do funcionamento das comunidades de insetos aquáticos em diferentes ecossistemas. A padronização do protocolo também permitirá comparações entre diferentes áreas da Amazônia, com estudos que podem auxiliar a formulação de políticas públicas e estratégias para a mitigação de impactos ambientais.

Apesar de haver sido elaborado para a região da Amazônia, o protocolo pode ser aplicado a outras áreas geográficas do Brasil e até mesmo a diferentes países. Para os autores do protocolo, seu uso também fortalece programas de monitoramento nacionais que possibilitam estudos de larga escala e contribuem para a formação de novos profissionais em biodiversidade, como o INCT SinBiAm, o Programa Monitora Aquático do ICMBio, além de redes de pesquisa consolidadas que contam com financiamento do CNPq, como o Peld (Programa Ecológico de Longa Duração), o PPBio (Programa de Pesquisa em Biodiversidade). “Esperamos que este protocolo seja adotado por pesquisadores, por órgãos ambientais como SEMAs, Ibama e ICMBio. A padronização permitirá comparações mais confiáveis entre regiões e ao longo do tempo, ampliando nossa capacidade de conservar e restaurar ambientes aquáticos”, observa a professora Karina.

Os pesquisadores acreditam que, além dos benefícios científicos, a adoção de protocolos padronizados contribuirá, do mesmo modo, para o fortalecimento da capacitação profissional e para a criação de redes colaborativas entre pesquisadores, gestores ambientais e comunidades locais, facilitando a implementação de programas de monitoramento de longo prazo. Ao refletir sobre o processo, o professor Leandro Juen observa que a ciência é construída em parcerias e colaborações. “Este estudo mostra a importância de unir esforços, pois a Amazônia, com sua complexidade e diversidade, exige pesquisas colaborativas. As grandes variações ambientais tornam essencial ouvir as diferentes vozes e experiências de cada região. Só assim o protocolo garante comparações em larga escala e ao mesmo tempo contempla as especificidades locais de forma adequada”, afirma.

Escrito em português e com linguagem acessível, para permitir ampla acessibilidade, o protocolo foi publicado no número especial, de julho a dezembro de 2025, da Revista EDUCAmazônia.

Pontos apresentados no protocolo – De acordo com a introdução do protocolo publicado no periódico EDUCAmazônia, o delineamento amostral adequado para o uso dos insetos aquáticos como indicadores deve considerar o número de amostras, os habitats a serem investigados e a sazonalidade climática. Insetos aquáticos são influenciados por variáveis ambientais, que incluem características estruturais como o tipo de substrato e a quantidade de amostras necessárias para uma representação precisa da fauna local.

Ao todo, o protocolo trata de dez pontos referentes a materiais e métodos usados em pesquisa envolvendo insetos aquáticos, partindo de equipamentos utilizados em sua coleta, delineamento amostral e coleta de dados. A seguir, o documento aborda coletas específicas, como as de ordens Ephemeroptera, Plecoptera e Trichoptera, conhecidos como EPT, e de coletas de Odonata larva e de Heteroptera (Nepomorpha), Heteroptera (Gerromorpha) e coleta de adultos de Odonata. O protocolo apresenta também procedimentos de laboratório, indicando que a identificação taxonômica dos insetos aquáticos coletados deve ser realizada em laboratório, com a utilização de chaves dicotômicas especializadas para cada ordem ou família, literatura específica e, se necessário, por meio de consulta a especialistas.

Métricas ambientais, que permitem avaliar mudanças nas características dos ecossistemas aquáticos e compreender como elas afetam as comunidades biológicas, também são assunto do documento. Nessa fase, ocorre o levantamento de dados físicos, físico-químicos e de integridade ambiental. O Índice de Integridade do Habitat (IIH) é uma métrica fundamental para a avaliação da integridade física do habitat. Baseado em uma avaliação visual de 12 parâmetros estruturais, a avaliação por esse índice inclui o padrão de uso do solo adjacente à vegetação ripária, a largura e o estado de conservação da vegetação ribeirinha, o estado da floresta ripária em uma margem de 10 metros e a estrutura e degradação das margens, entre outros.

Além de métricas de resposta biológica, o protocolo especifica no subtítulo materiais e métodos como o Índice de Proporção Zygoptera/Anisoptera, direcionado para a avaliação da integridade ambiental de igarapés amazônicos. Esse índice, que tem sido adotado pelo ICMBio para o monitoramento de Unidades de Conservação Amazônica, também tem se mostrado eficiente para a avaliação de riachos e de outros biomas, como o Cerrado e a Mata Atlântica.

Importância dos insetos aquáticos – Os insetos aquáticos são organismos-chave para a análise e o monitoramento dos ecossistemas aquáticos de água doce naturais que se encontram sob diferentes intensidades de influências antrópicas, ou seja, atividades humanas que impactam o meio ambiente. Além de realizar funções ecológicas, como a decomposição de matéria orgânica e o controle populacional de outros organismos, e de ser o elo de interações do meio aquático com o terrestre – o ciclo de vida desses insetos apresenta ao menos uma fase aquática, enquanto, quando adultos, eles são predominantemente terrestres e alados – eles atuam como bioindicadores da qualidade da água e do habitat, devido à sua sensibilidade ou tolerância às alterações ambientais. Sua diversidade pode diminuir, aumentar ou se modificar em relação à condição ambiental do ambiente.

O estudo dos insetos aquáticos é relevante para o diagnóstico da condição de um ecossistema em razão de esses organismos apresentarem particularidades como suficiência taxonômica e comunidades substitutivas, o que se refere à possibilidade de utilização de subconjuntos para representar a resposta de toda a comunidade. Algumas modificações antrópicas podem ser mascaradas pela sazonalidade climática, que altera as variáveis abióticas relacionadas à fauna, como o oxigênio dissolvido na água. Desse modo, há necessidade de amostragens ao longo do tempo. Sistemas mais dinâmicos exigem maior esforço amostral para garantir a representatividade dos organismos, e a escolha da técnica a ser empregada para a coleta dos insetos aquáticos depende do tipo de ambiente – aquático ou terrestre – , das características dos insetos alvo e dos objetivos do estudo.

TEXTO: Reprodução Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

FOTOS: Diovulgação

Relação com os ODS da ONU:

ODS 4 - Educação de Qualidade

Leia também

Compartilhe

Facebook
Twitter
LinkedIn
Telegram
WhatsApp
Email
Print
Pular para o conteúdo