A contribuição de Jane Felipe Beltrão para a educação e formação superior no Pará ratificada. O título de professora emérita da Universidade Federal do Pará (UFPA) recém conquistado foi celebrado em cerimônia solene realizada no Centro de Eventos Benedito Nunes, no Campus Guamá, e contou com a participação de membros do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe), da comunidade acadêmica, de amigos e de familiares da homenageada.
Em seu discurso, Jane Beltrão percorreu os corredores da memória e contou sobre sua trajetória na UFPA, lugar ao qual dedica seu trabalho há 44 anos. Com mestrado em Antropologia e doutorado em História, a docente que se define como “acadêmica-militante pelo respeito aos direitos étnicos-raciais e sociais constitucionais” foi potente e política do início ao fim. “A militância me permite ser acadêmica e a academia me permite ser militante. Assim, espero que os anos de vida que ainda tenho pela frente passem sempre ao lado das boas causas”, delineou aos presentes.
A concessão do título à Jane Felipe Beltrão foi proposta pelo reitor da UFPA, Emmanuel Zagury Tourinho, e aprovada por unanimidade pelo Consepe, em sessão realizada no dia 13 de dezembro de 2023. A honraria é concedida apenas a docentes que têm reconhecidas contribuições para a Universidade, para a sociedade e para o desenvolvimento da pesquisa, do ensino, da extensão, além de produção intelectual, científica ou artística considerada de potencial relevância.
Na UFPA, Jane é vinculada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFPA (IFCH) e atua como docente permanente nos Programas de Pós-Graduação em Antropologia e em Direito. Como bolsista de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) nível 1B, ela formou e orientou 163 novos profissionais e/ou pesquisadores ao longo da carreira nas áreas de Antropologia, Direito e Saúde, sempre sob a perspectiva interdisciplinar.
Beltrão soma-se ao seleto grupo composto por 52 professores a conquistarem o título de eméritos na UFPA, a nona do sexo feminino. “Faço uma pequena observação à partida. Falarei sempre na flexão do gênero feminino da língua portuguesa, pois ela é tão válida quanto a masculina e soa como suave rebelião tanto em tom, como pela possibilidade de exercitar o ensino da arte de fazer educação política. Nós mulheres somos seres políticos e atuamos em cenários diversos mesmo quando a indivisibilidade tenta calar nossas vozes, sobretudo aquelas de surgiram nas Amazônias, territórios onde falar alto, e por vezes gritar, se faz necessário”, demarcou logo no início do pronunciamento.
Entre os inúmeros feitos, a nova professora emérita destaca-se como pioneira e referência nas Políticas de Ação Afirmativa para Povos Indígenas e Quilombolas no Norte do Brasil, tendo estado na coordenação do Programa de Ação Afirmativa para Povos Indígenas e Populações Tradicionais da UFPA (Papit), no qual protagonizou a criação da Política de Inclusão de Pessoas Indígenas e Quilombolas por meio da reserva de duas vagas em todos os cursos de Graduação e campi da UFPA, via Processo Seletivo Especial. Ela também protagonizou a criação do curso de Etnodesenvolvimento e da Faculdade de Etnodiversidade na UFPA de Altamira, voltado para povos indígenas e populações tradicionais (agricultores, ribeirinhos, pescadores).
Atualmente, Jane Beltrão coordena, juntamente com o professor José Héder Benatti, o Projeto Diversidade Étnico-Racial e os Direitos Territoriais na Amazônia para Indígenas e Quilombolas na UFPA, tendo participado ativamente da implementação do curso de Mestrado e Doutorado Intervalar para Indígenas e Quilombolas na UFPA, no Instituto de Ciências Jurídicas (ICJ).
“O nome de hoje é meu, mas o trabalho realizado é mérito coletivo. Coletivo que trabalha em conjunto com todas as pessoas que integraram o cortejo que me conduziu a este palco. Das inúmeras orientandas com as quais consegui dialogar, das técnicas que me auxiliaram, e me auxiliam, a caminhar pisando em terrenos planos e também das estudantes que estiveram sob a minha responsabilidade docente ao longo da jornada”, afirmou a homenageada durante o discurso, destacando a desinência feminina como de início anunciado.
Homenagens
A cerimônia de outorga do título de professora emérita da UFPA à Jane Felipe Beltrão contou com a participação de Jimena Beltrão e Paulo Rabelo, irmã e primo da homenageada, respectivamente, que atuaram como os cerimonialistas da ocasião. A mesa da solenidade teve as presenças do reitor da UFPA, Emmanuel Zagury Tourinho, e do professor e o coordenador do curso de Etnodesenvolvimento do Campus de Altamira, Uwira Xakriabá, responsável por fazer a saudação inicial à professora Jane Beltrão.
“A trajetória de Jane amalgama-se com a trajetória de ciência na Amazônia. Desde que ela chegou a esta Casa, é a professora que de fato ensina e que faz do ensino também a aprendizagem. Ela ensina e faz”, destacou o amigo docente Xakriabá que no passado fora também aluno e orientando. “O título é pequeno para Jane. Nós não teríamos conseguido avançar o que avançamos sem o trabalho e dedicação dela. Por isso, nós, povos da Amazônia, nos alegramos e te saudamos, Jane”, afirmou o professor em um dos momentos mais emocionantes da cerimônia quando o auditório inteiro se pôs de pé para aplaudir a docente.
Para o reitor da UFPA, Emmanuel Tourinho, a concessão do título de professora emérita a Jane Beltrão representa a coroação de uma carreira brilhante. O reitor acredita que o título merece ser concedido a docentes com contribuições que transcendam suas atribuições regulares e impactem o destino da instituição de modo considerável.
“Com a professora Jane Beltrão aprendemos todos os dias as várias dimensões das tragédias vividas pelas populações tradicionais da Amazônia. Mais do que isso: aprendemos o que podemos fazer para cumprir a nossa obrigação de enfrentá-las”, declarou. “Devemos, em larguíssima medida, às professoras Jane Beltrão e Zélia Amador de Deus, as políticas institucionais que propiciaram à UFPA ter mais a cara da nossa população. Destemida como poucas, intelectualmente rigorosa e afetuosa, a professora Jane Beltrão acumula o respeito e o carinho da nossa comunidade”, complementou Emmanuel Tourinho.
Família
Além da expressiva presença de colegas professores, amigos, técnicos administrativos e estudantes, Jane Beltrão também foi saudada por familiares, com destaque para o filho Raoní Beltrão do Vale, responsável por conduzir a homenageada logo à frente do cortejo e a mãe, Júlia Felipe Mangas, que também fez questão de participar do cortejo na companhia da filha, e irmã de homenageada, Jacira Felipe Beltrão.
“A Jane sempre foi uma excelente aluna. Desde o primário até a faculdade. Como professora ela não mudou. Sempre foi de lutar pelos outros. É um orgulho vê-la aqui”, derreteu-se em elogios a matriarca de 100 anos.
“Por onde eu passei, sempre ouvi as melhores referências sobre a minha mãe. Eu aprendi a andar, literalmente, aqui na UFPA e aqui ela passou por muitos Centros, então eu me lembro dela dando aula desde a saúde até o Direito e formando muitos alunos. A gente brinca que ela é a Fundação Jane, pois são incontáveis as vezes em que apoiou estudantes com seus próprios recursos. Ela é um orgulho acadêmico e também pessoal. Tem uma generosidade sem limites. Um título, sem dúvidas, merecido “, enfatizou o filho que conduziu a homenageada no cortejo de entrada.