De acordo com estudo realizado pelo Laboratório de Farmacologia Molecular do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e pelo Núcleo de Teoria e Pesquisa do Comportamento (NTPC), ambos da Universidade Federal do Pará (UFPA), tem sido reportado que 75% de todas as emissões de mercúrio para o ar na América Latina são originadas na Amazônia. Dentre as atividades antropogênicas que emitem mercúrio, estima-se que a mineração de ouro artesanal e/ou em pequena escala – isto é, em aspecto rudimentar, dada a suposta ausência de maquinário industrial – seja responsável por mais de 200 toneladas métricas de mercúrio ao ano liberadas no ambiente amazônico. O mercúrio no ar prejudica solos, plantas e rios, afetando não apenas o entorno dos garimpos, mas também ambientes mais longínquos.
A fim de desenvolver e implementar estratégias realistas e duradouras para enfrentar a contaminação e a exposição ao mercúrio na Amazônia, a UFPA uniu-se às universidades federais do Amapá (UNIFAP), de Rondônia (UNIR), do Oeste do Pará (UFOPA), bem como a Universidade do Gurupi (UNIRG), localizada em Paraíso do Tocantins (TO), para a criação do Instituto Amazônico do Mercúrio (IAMER) que tem a professora da UFPA, Maria Elena Crespo López, na coordenação.
Objetivos – Com o financiamento inicial do Ministério da Justiça, está sendo possível implementar os primeiros cinco polos padronizados de testagem de mercúrio em populações humanas de quatro Estados amazônicos diferentes (Pará, Amapá, Rondônia e Tocantins). A curto/médio prazo, o IAMER objetiva discutir o problema da presença de mercúrio na Amazônia de forma multidisciplinar a partir de três eixos centrais: geração de dados para o desenvolvimento de estratégias de prevenção; capacitação de profissionais (justiça, saúde, ambiente etc.); conscientização e empoderamento dos amazônidas na procura por um modelo de desenvolvimento sustentável.
“A longo prazo, almeja-se implementar pelo menos um polo de testagem padronizado em cada Estado amazônico, agregando grupos de pesquisa qualificados dentro da rede, além de desenvolver ações transdisciplinares com uma visão decolonial do problema”, explica Crespo López.
Também é intenção do IAMER associar-se a diferentes parceiros, como sociedade civil, empresas, entes públicos etc., especialmente aqueles que estão na Amazônia. Entre as atividades desenvolvidas pelo Instituto, estão previstos cursos de capacitação sobre o tema; a criação do Observatório Amazônico do Mercúrio com publicação bianual de relatório; o estabelecimento de parcerias com as Secretarias de Saúde Estaduais e Municipais para a notificação e encaminhamento de casos; e produção de material educativo.
Na UFPA, além do Núcleo de Medicina Tropical (NMT), os laboratórios de Farmacologia Molecular, de Neuroquímica e Biologia Celular; e de Genética Humana e Médica, vinculados ao ICB, em Belém; a Faculdade de Medicina e o Laboratório de Ecologia, em Altamira, reúnem as(os) pesquisadoras(es) da região Norte que têm estudado os impactos nas comunidades da Amazônia expostas ao mercúrio ao longo da última década.
Perigo – A presença de mercúrio na Amazônia é um problema sistêmico de grande complexidade, com efeitos devastadores sobre a segurança alimentar, a saúde pública e o meio ambiente das comunidades da Amazônia. O mercúrio não se decompõe facilmente no meio ambiente, o que o leva a entrar em um ciclo contínuo de deposição e remoção entre o solo, os corpos d’água e a atmosfera. Esse ciclo permite que a substância percorra grandes distâncias, afetando não apenas aqueles que estão no entorno das áreas contaminadas como , povos e comunidades tradicionais, incluindo ribeirinhos e indígenas, mas também aqueles que vivem nas áreas urbanas da Amazônia.
Dados recentes indicam que peixes contaminados com mercúrio estão disponíveis para consumo humano em mercados de várias cidades amazônicas, tanto nas regiões mais afetadas pela mineração, como a bacia do Rio Tapajós, quanto em áreas metropolitanas como Belém, onde não há atividade mineradora.