“A paternidade me transformou, me tornou um homem melhor, sensível, que sabe lidar bem com a autoridade em relação aos limites e me ajuda no papel de professor e orientador de mestrado e doutorado”. Essa é a experiência pessoal do professor doutor Janari Pedroso, da Faculdade de Psicologia, Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, da Universidade Federal do Pará (UFPA). O pesquisador também tem uma visão científica sobre a paternidade, tema de muitas pesquisas por ele conduzidas na academia. Recentemente, no contexto da pandemia, muitos pais se viram diante de uma preocupação até então majoritariamente das mães: como conciliar vida profissional com a parentalidade?
Segundo Janari Pedroso, a pandemia da Covid-19 mostra que há uma necessidade de mudança na participação do papel do pai no cuidado com os filhos em virtude dos impactos que o maior tempo de permanência da criança e dos adultos em casa, por conta do isolamento social, produziram nas famílias em relação às rotinas. “Neste sentido, os pais precisam desenvolver habilidades para brincar com a criança, participar ativamente dos cuidados básicos para não sobrecarregar a mãe”, aponta.
O relatório internacional State of the world’s fathers aponta que “os pais precisam se esforçar – e, na prática, isso significa que os homens individualmente fazem mais a cada dia. Deve haver um esforço deliberado e coletivo para estimular os homens a fazerem 50% do trabalho de cuidado. É vital desafiar a noção de que os homens estão ‘ajudando’ em vez de compartilhar o cuidado igualmente. Isso significa encorajar e apoiar os pais a participarem de grupos com seus bebês e filhos, para desenvolver sua confiança e habilidades, e a se comprometerem a compartilhar os cuidados não remunerados e o trabalho doméstico igualmente com suas parceiras" (tradução do pesquisador).
Rede de apoio – Janari Pedroso tem quatro filhos maiores de idade e dois netos, de 2 e 9 anos de idade. “Fiquei triste e com muitas saudades, já que não podia estar com eles devido à restrição da pandemia e também porque tive Covid-19 e ainda perdi meu pai. Mas depois de seis meses afastado, meu neto menor, quando o encontrei, ficou agarrado no meu corpo, eu fiquei muito emocionado. Do jeito dele, falava da saudade”. O professor destaca que o apoio da sua rede social foi fundamental para conseguir superar e ser resiliente às adversidades, de modo que, para ele, todo o papel de paternidade e maternidade depende muito da base familiar, social, institucional da qual se dispõe para lidar com as exigências do cuidado.
Como pesquisador, Pedroso começou a estudar o tema em 2013, como orientador da dissertação A paternidade após o rompimento conjugal, de Roberta Bandeira, que objetivava compreender a paternidade na perspectiva do rompimento conjugal, já que, na maioria das vezes, na separação conjugal de casais com filhos, há um distanciamento físico e emocional dos pais por vários motivos. “Neste estudo, verificamos que pais se relacionam com os filhos ainda muito influenciados pelo modelo tradicional de papéis familiares, em que a função paterna primordial centraliza-se nas necessidades econômicas, mas há uma mudança na atualidade, quando se preocupam com os cuidados parentais e o envolvimento emocional com os filhos. Essa paternidade só é possível de ser exercida se houver a capacidade dos ex-cônjuges em diferenciar o relacionamento parental do relacionamento conjugal”.
Em andamento – “Mais recentemente, em 2020, orientei outra dissertação, como parte de um projeto de pesquisa desenvolvido conjuntamente com os professores do Programa de Teoria e Pesquisa do Comportamento, Celina Magalhães e Aumari Gouveia, sobre o apego entre pai e bebê prematuro no método canguru, com a mestranda Zuly Garnica, que analisou a importância do vínculo entre os pais e o recém-nascido com base no contato pele a pele no método canguru (Hospital Santa Casa). Concluímos que os pais precisam de apoio da equipe de saúde para cuidar no método canguru; os pais expressaram a necessidade de uma licença estendida para estar com o bebê, já que a profissão concorre com a necessidade de ficar com o bebê; e que a posição canguru promoveu o vínculo entre os pais e os bebês.
Ainda, em continuidade, está em desenvolvimento um estudo no Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, com a mesma discente, que envolverá pais latinos (brasileiros e colombianos), sobre o apego entre o pai e o bebê de 0 a 12 meses de idade. O objetivo é analisar o comportamento de afeição e os fatores culturais que a ele se relacionam e que, provavelmente, abordarão o impacto da pandemia em relação ao vínculo afetivo entre o cuidador-pai e a criança. “A centralidade no pai não desconsidera o papel materno, mas nossa ênfase volta-se para a psicologia paterna”, conclui o pesquisador.
Novas rotinas – Enquanto a vida profissional e estudantil se torna cada vez mais digitalizada, as rotinas domésticas ficam mais intensas. O professor Eduardo Vieira, lotado no Instituto de Educação Matemática e Científica (IEMCI), tem dois filhos em idade escolar de 13 anos e 7 anos. “Estamos vivendo grandes desafios. Temos que educar para um mundo diverso e socialmente responsável. A Pandemia é um exemplo prático para nossos filhos sobre a importância da ciência, sobre a responsabilidade que temos como indivíduos e sobre a necessidade de intercâmbio com o mundo”, afirma.
Com tantos protocolos de segurança a serem seguidos, o professor, que é biólogo de formação e tem mestrado e doutorado na área de Ensino, lembra que, tanto no contexto da pandemia de covid-19, quanto da paternidade responsável, cuidar de si é também cuidar do outro. “Não podemos alcançar o bem-estar individual sem termos isto na coletividade. A pandemia, inevitavelmente, proporciona reflexões nesta direção, com possibilidade de incidir positivamente na educação de crianças e jovens”, observa.
Desafios – Já o professor Carlomagno Pacheco Bahia, da Faculdade de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, lotado no Instituto de Ciências da Saúde (FFTO/ICS), tem um filho Biomédico, mestre em Neurociências, e uma menina de 10 anos que está cursando o ensino fundamental. Para ele, os maiores desafios da atualidade são: “organizar o tempo para estar presente na vida dos filhos, conciliando trabalho e qualidade de vida; prestar formação humanizada com ênfase em responsabilidade social e bem-estar coletivo; distinguir o que é verdade e o que não é verdade em tempos de notícias falsas; e conciliar a vida digital com a vida em sociedade e sustentabilidade do que temos de natureza”.
Aprendizagem – O professor Carlos Diniz, do diretor do Instituto de Ciências Exatas e Naturais (ICEN), é pai de três: o primogênito tem 15 e as duas meninas mais novas têm 4 e 2 anos. “A experiência de ser pai na pandemia é difícil e cansativa, mas traz muitas aprendizagens. Me vi trancado no apartamento com meus filhos durante três meses e pude ver de perto como eles vivenciaram esse momento. Meu filho sentiu muita solidão com o distanciamento dos colegas, o que não foi fácil de superar. Já minhas filhas menores sofreram com falta de espaço para correr e se movimentar, o que me levou, inclusive, a tomar a decisão de mudar minha habitação”, revela.
De certa forma, para a maioria dos pais, a pandemia trouxe uma condição de muito mais presença na vida dos filhos e de muito mais diálogo. “Esse momento abriu a oportunidade de trabalharmos a conscientização e a responsabilidade deles em relação à situação que vivemos, até mesmo sobre política e sociedade. Conversamos sobre o risco de morte, lidamos com sentimentos de possíveis perdas e nos aproximamos uns dos outros”, conta Diniz. Para ele, nesse sentido, a experiência da paternidade na pandemia pode ser também construtiva.
Texto: Jéssica Souza – Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA
Imagens: Ascom/UFPA e arquivo pessoal